quarta-feira, 22 de abril de 2015

Especial Dublagem - The Witcher 3: Wild Hunt - 500 mil reais + 8 meses + 80 dubladores + 800 personagens + Muita informação


Quanto custa dublar profissionalmente um jogo no Brasil? Quanto tempo demorou a dublagem de The Witcher 3: Wild Hunt? Quantos personagens? Quão rica ela é? A boca/lábios dos personagens mexe conforme a fala? Essas e outras perguntas serão respondidas nessa matéria especial de dublagem aqui na WitcherBR.

Dublagem agora é obrigação

De cinco anos pra cá, dublar um jogo em português do Brasil (ou PT-BR) tornou-se quase um padrão para qualquer lançamento de grande porte, os chamados "AAA". É um investimento que pode passar de R$ 500 mil em projetos mais complexos, como um "Assassin’s Creed" e "The Witcher 3: Wild Hunt", e envolver literalmente centenas de dubladores por meses.

"Enquanto jogos de tiro, de corrida ou de plataforma podem não exigir conhecimento em inglês, RPGs sem tradução para os idiomas locais vão atrair apenas um pequeno grupo de jogadores, fluente em inglês", teoriza Marcin Iwinski, co-fundador da CD Projekt, que em maio vai lançar "The Witcher 3: Wild Hunt", cujo trabalho de dublagem em português durou oito meses e envolveu duzentos dubladores, que se dividiram entre pouco mais de 800 personagens (previsão inicial de 531, porém o projeto cresceu durante sua produção).

O potencial mercado brasileiro tem atraído cada vez mais empresas no processo de regionalização dos jogos. Para se ter uma ideia, apenas o Estado de São Paulo possui uma população equivalente a vários países Europeus juntos. Natural esse investimento aqui. "O potencial do mercado já está provado", diz Marcio Soares, gerente de negócios da Ubisoft.

Público exigente e nossa experiência cada vez maior

O público gamer é exigente e não exita em criticar qualquer defeito de dublagem ou tradução. Felizmente, é cada vez menor o número de dublagens toscas, como foram os casos de "Killzone 3" (2011), cujas interpretações não passavam emoção alguma,  de "Max Payne 3" (2012), que tinha vozes em português com um claro sotaque estrangeiro ou "Mortal Kombat X "(2015) que certamente erraram a mão durante a direção.



"Dublar um game é muito diferente de dublar um filme, pois na maioria dos casos você não tem a imagem para servir de referência", explica Cristiano Prazeres, dono da Maximal, um estúdio de dublagem especializado na área de games e que, hoje, só trabalha com este segmento, tendo no currículo títulos como "Grid 2" e "Battlefield 4".

The Witcher 3: Wild Hunt exigiu muito dos dubladores

"Recebemos apenas o áudio em inglês, precisamos analisar a tonalidade de voz e imaginar a cena para dublar" diz Sérgio Moreno, dono de um estúdio que leva seu nome.

"No game em si trabalhamos direto uns cinco meses. Teve tempos em que ficamos com quatro estúdios simultâneos para gravar tudo. E só com o Geralt devo ter gravado 30 dias", diz Moreno. "É essa coisa de RPG. Na mesma cena você tem três, quatro opções". No total foram oito meses de trabalho que não acabou, vem uma expansão nova até o final do ano.

"Quando você está dublando um filme, vê tudo o que está acontecendo, como a expressão facial do personagem e o que ele está fazendo. No game, sem a imagem, é preciso prestar muito mais atenção na voz, que é a única referência", explica Ricardo Juarez, que já fez Kratos em "God of War: Ascension", dentre outros trabalhos.

Elenco experiente conta

Enquanto que nos EUA a profissão de dublador é pouco comum, a maior parte do conteúdo já está disponível em inglês, o Brasil tem o caminho oposto. Tudo que vem de fora precisa ser dublado. Isso garantiu a profissionalização do dublador com uma vasta experiencia. Já temos uma das melhores dublagens do planeta.



Além do próprio Sérgio Moreno, o elenco de "The Witcher 3" conta com vários outros atores e dubladores bem conhecidos dos brasileiros, como Orlando Drummond e Maria Helena Pader. Se você está assistindo à novela "O rei do gado", vai se lembrar da voz dela na hora. Ela é a Júlia, uma das empregadas de Bruno Mezenga. Pelo jogo você pode reconhecer algumas vozes, o imperador de Nilfgaard é o próprio Volverine.

Essa escolha de profissionais entendidos do assunto, somada à ótima tradução de falas de contexto espalhadas por "The Witcher 3", como uma criança brincando na rua, um comerciante pedindo ajuda ou guerreiros treinando para a batalha, ajuda você a mergulhar na aventura de Geralt, tornando a experiência muito mais viva e autêntica. Como o jogo é bem longo, atenção é algo fundamental.

Geralt na voz do Sérgio Moreno

Durante a localização de Geralt - Moreno gosta de dizer que só é dublagem quando você coloca "som em cima de alguma imagem", e na maioria dos games não há referências - ele conta que foi até preciso tirar alguns intervalos do personagem.

"[Porque] você tem uma responsabilidade do tamanho de um Geralt, sabendo que o povo é exigente, sabendo que ele é um bruxo e que faz coisas que não são do seu dia-a-dia. Por isso, eu intercalava as gravações, dava um tempo de dois ou três dias, e depois voltava. Foram 70 mil arquivos, se não me engano, só do Geralt", afirma.


Houve ainda um cuidado especial com a voz do Geralt, para parecer rouca e sem sentimentos equivalente ao áudio original americano.

80 Dubladores e mais de 800 personagens durante 8 meses

É inegável a complexidade da dublagem de The Witcher 3: Wild Hunt. Enquanto você passeia por alguma cidade, você não está sozinho. Há pessoas na tela, e todas elas falam. E falam em português. É um dos primeiros games nacionalizados que realmente teve seu conteúdo 100% dublado. Como conseguiram isso? Foram 80 dubladores em mais de 800 personagens.

É o estúdio de Moreno que está por trás da dublagem de "The Witcher 3", no qual interpreta o personagem principal, Geralt. "Todo o elenco de dubladores do Rio de Janeiro [onde fica o estúdio] não dá conta de um projeto como ‘The Witcher 3’", diz Moreno. Por essa razão – e por motivos econômicos também, é claro -, é muito comum que um mesmo dublador faça múltiplas vozes num mesmo título.

E é nesse ponto que as coisas podem começar a dar errado, já que para personagens que só tem uma ou duas falas às vezes sequer há o áudio original para servir de guia: "Muitas vezes uma voz não bate com o personagem por conta da falta de referência e não há o que ser feito, pois o número de dubladores no projeto é delimitado conforme escopo e orçamento", explica Prazeres.

São Paulo e Rio de Janeiro polarizam a imensa maioria das dublagens de games. Na primeira cidade, um dublador ganha R$ 200 por hora de trabalho, cálculo baseado numa projeção de 800 palavras por hora. Já no Rio o conceito é diferente, baseado em arquivos gravados, que custam R$ 6, mas podem variar radicalmente de tamanho.

Evolução

Muitos dubladores sequer estão familiarizados com jogos eletrônicos: "Os [dubladores] mais novos até curtem games e conhecem o processo, mas os mais velhos não se importam muito nem em ver o resultado final", diz Prazeres, que procurar dar chance a novos profissionais. "Os estúdios precisam se especializar [em games] para contornar os obstáculos desse processo, que não vai mudar".



Para Moreno o dublador acostumado com TV e teatro vai encontrar dificuldade ao trabalhar com games: "O mercado de dublagem é muito fechado e não há tempo de ensinar os novos [profissionais]. Ainda estamos aprimorando esse elenco, que melhora a cada jogo".

Lábios dos personagens, como fica o resultado final?

Uma das queixas dos jogadores é que a expressão final dos lábios do personagem não é condizente com a dublagem. É mais psicológico do que realidade. "É claro que em potencialmente impactantes de CG tentamos sincronizar os lábios com a dublagem" ... "mas o grosso do jogo é todo feito automaticamente por scripts, seja em inglês ou em português" diz o gerente de marketing da CD Projekt RED. Seria custoso mesmo em um único idioma sincronizar a dublagem aos lábios do personagem.

Completamos ainda que por vezes, um RPG possui tantos diálogos, que o jogador está com a visão antenada as letras na tela, sem ter tempo para perceber esses detalhes. A regionalização elimina essa etapa, portanto passa a ser comum surgir nesse momento esse tipo de crítica.

E no inglês?

Como dubladores profissionais são escassos no idioma inglês, é comum a presença de atores famosos no processo. Isso não significa que é uma tarefa fácil. O ator Ed Murphy que fez a voz do personagem burro em Shrek explica que foi preciso quatro meses de treinamento antes de por a mão na massa.



A versão em inglês contará com a voz de Charles Dance (Games of Thrones). "Eu nunca tinha trabalhado com jogos, foi emocionante", diz Dance. A voz de Geralt continua pertencente a Doug Cockle, responsável pela mesma nos primeiros dois jogos.

Como é feita uma dublagem no Brasil?

O UOL fez um esquema mostrando como é feito na maioria das vezes a dublagem de um jogo no Brasil.

Pré-produção

Entre três e seis meses antes do lançamento do jogo, o estúdio recebe a planilha com os diálogos de cada personagem ou cena, que normalmente já foram traduzidos para o português por outra empresa. Como não há vídeos para orientar o trabalho, o dublador costuma se basear pelo briefing de cada personagem – dos principais, ao menos. Às vezes é possível ter acesso aos diálogos em inglês. 
O estúdio, então, faz o casting, sugerindo ao cliente algumas opções de vozes para os personagens principais. Para os secundários, a escolha é “no escuro”, pois não há brefing para estes. 
Cada áudio original é separado e organizado cena por cena; assim o dublador entre em ação apenas para gravar. 

Gravação

É hora de os dubladores trabalharem. E como trabalham: “Battlefield 4”, por exemplo, teve 150 mil palavras, que equivalem a 180 horas de gravação. 

Como há jogos com centenas de personagens, é comum haver a “dobra”, quando um mesmo dublador interpreta diferentes personagens – às vezes 10 ou 15. Como faltam referências para o profissional, muitas vozes não batem com o personagem. Além disso, o diretor de dublagem precisa ter atenção ao roteiro, para que dois personagens dublados pelo mesmo profissional não corram o risco de se cruzar ou interagir durante o game.

Os arquivos são enviados ao cliente por link direto seguro, tudo sob acordo de confidencialidade. 

Pós-produção

Um estúdio no exterior ou o próprio publisher se encarrega de colocar os arquivos no jogo, quando é feita a inserção de efeitos (sons de tiro, portas abrindo etc) e a sincronia labial.

Nossa opinião

Complicado escolher, não é mesmo? A dublagem brasileira recebeu um investimento e um carinho especial por parte da CD Projekt RED. Todo o projeto foi fiscalizado de perto e o resultado final é surpreendente pelos gameplays apresentados. Ao contrário, a americana possui a já consagrada voz de Doug Cockle no papel de Geralt, e agora vozes famosas como Charles Dance no papel de Emhyr var Emreis. Então qual escolher?


É uma resposta pessoal, mas darei a minha: com todo o investimento e crença no Brasil, vou optar pela dublagem em português. Agora, claro, The Witcher 3: Wild Hunt certamente é um jogo que merecerá ser jogado pela segunda vez, afinal de contas, suas ações mudam conforme a escolha, e todos somos curiosos. Resolvido, na segunda vez vamos conhecer a voz de Charles Dance. É dessa forma que jogarei, e você?

The Witcher 3: Wild Hunt chega dia 19 de Maio para PC, Xbox One e PS4.

Matéria feita pela WitcherBR com auxílio de conteúdo publicado no UOL e no G1.

Nenhum comentário:

Postar um comentário